MARILYN MONROE

Entrevista concedida por e-mail a Luna Normand para sua reportagem “O mito Marilyn cinquenta anos depois”, in Jornal Pampulha, Belo Horizonte, 11 a 17 fev. 2012, p. 12.

Por que Marilyn Monroe ainda desperta fascinação nas pessoas quase 45 anos após a sua morte?

Marilyn Monroe possuía uma qualidade rara: fotogenia. Nem todas as pessoas bonitas fotografam bem; o iluminador, fotógrafo e o cinegrafista precisam se esforçar para encontrar o ângulo certo para que a imagem tomada revele a beleza do ator ou da atriz fotografados ou filmados. A beleza é sempre imperfeita, e a câmera é cruel – com as pessoas feias, especialmente, mas também com as bonitas e mesmo com as lindas. Já Marilyn – que, como todas as grandes belezas também tinha uma beleza imperfeita – um nariz estranho, uns joelhos duvidosos – fotograva bem em qualquer ângulo. Como dizia Billy Wilder, a câmera “devorava” Marilyn Monroe. Ela sempre chegava atrasadíssima para as filmagens, parecia um verdadeiro “caco” para os diretores, que se desesperavam imaginando que a tomada ia sair uma droga – mas ao ligarem as câmeras Marilyn se transformava e quando a película era revelada, havia como que um halo dourado de perfeição e luz em torno dela…

O que fez de Marilyn Monroe um ícone que transpõe gerações?

Um complexo de qualidades e de defeitos: a beleza natural mesclada aos artifícios de sua genial maquilagem; os dramas pessoais no auge do sucesso – as paixões infelizes, a solidão invencível, o envolvimento amoroso com o Presidente Kennedy e seu suicídio suspeito de assassinato; a aparência de alegria e futilidade num fundo de angústia e trabalho árduo e estressante; e um sistema de produção de estrelas (o star-system de Hollywood) que já não existe mais.

Loira de corpo exuberante e voz provocante. Quais as principais características que ajudaram a fazer de Marilyn Monroe ícone de Hollywood?

Além de suas qualidades próprias, Marilyn Monroe – que tingia e alisava os cabelos para parecer aquela loira platinada de seu ícone – teve a sorte de ser dirigida por alguns dos melhores diretores de sua época: John Huston, Joshua Logan, Billy Wilder, George Cukor, Otto Preminger, Howard Hawks, Henry Hathaway, Joseph L. Mankiewicz, Edmund Goulding, Roy Ward Baker, Walter Lang, Laurence Olivier…, de modo que quase todos os seus filmes são ótimos. Ela viveu a última fase de grandeza de Hollywood, e seu divismo beneficiou-se de produções clássicas, onde a estrela merecia um tratamento especial – nos grandes estúdios, um filme girava em torno da personalidade que a estrela projetava na tela. Depois dela, as estrelas de cinema tiveram cada vez mais dificuldades em projetar sua personalidade nos filmes que conseguiam fazer. O fim do Código de Produção, em 1968, coincidiu com o fim do star-system e do sistema tradicional de produção dos grandes estúdios.

Podemos afirmar que ela era moderna demais para sua época, talvez por isso tenha se tornado ícone pop da cultura americana?

Marilyn Monroe foi uma diva diferente das que vieram antes dela, pois ela não encarnava mais o estereótipo da femme fatale das divas do cinema mudo, nem o da prostituta ou amante romântica do cinema falado até então, mas o novo estereótipo da mulher-objeto, da mulher-pelada-de-calendário, da pin up que se tornou popular durante e após a Segunda Guerra. Mas ela vai transformar sutilmente, em suas atuações, o estereótipo de “loira burra” para o qual os produtores a empurravam, através de qualidades próprias que poucos notaram: uma consciência crítica diante de seus personagens, uma injeção de inocência na requerida malícia, uma angústia que ela fazia agitar-se dentro do vazio. A ambiguidade que ela projetava em suas personagens conseguia espiritualizar a carnalidade de sua pretensa pin-up, tornando sua imagem algo de indefinível e muito à frente de seu tempo.

Marilyn Monroe era realmente uma boa atriz ou sua fama se resume à publicidade de seus escândalos?

Em Fragments: Poems, Intimate Notes, Letters, compilação de textos escritos por Marilyn Monroe (1926-1962) entre 1943 e 1962, a atriz revelou sua frustração de ver seu lado intelectual ignorado, sempre confundida com seus personagens. No prefácio, Antonio Tabucchi escreveu que “no interior deste corpo vivia a alma de uma intelectual e poeta de que ninguém tinha um pingo de suspeita”. Mas já era sabido que a “mãe de todas loiras burras” possuía uma gigantesca biblioteca, participava de leituras de poemas e escrevia poesias quando se deprimia. Mostrou seus poemas apenas a dois amigos, que ficaram deprimidos depois de lê-los, um deles chegou a ter uma crise de choro. Marilyn descobriu James Joyce aos 26 anos ao interpretar o monólogo de Molly (seu exemplar de Ulisses foi leiloado pela Christie’s em 1999). Passou a admirar Samuel Beckett ao frequentar o Actor’s Studio. E era fascinada por Walt Whitman, W. B. Yeats, George Bernard Shaw, Ernest Hemingway, Tennessee Williams, D. H. Lawrence, Scott Fitzgerald, John Steinbeck. Hollywood subestimou Marilyn. Mas Jean-Paul Sartre a elogiou como grande atriz e Truman Capote escreveu que Marilyn era uma luz tão tênue que câmara alguma conseguiria captar. Basta ver Niagara (Niagara, 1953), de Henry Hathaway, onde ela interpreta uma femme fatale que planeja o ardiloso assassinato da esposa do amante; ou Don’t Bother to Knock (Almas desesperadas, 1952), de Roy Ward Baker, onde encarna uma baby sitter perturbada que tenta matar a criança posta a seus cuidados, para constatar seu enorme potencial dramático.

2 Respostas para “MARILYN MONROE

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